Artigos de Jornal
Brumas sobre o vale de la(gri)mas da Vale
Imaginem uma barragem com 1,4 vezes a altura do Elevador Lacerda (86m) e
12.700.000 m³ de lama tóxica se rompendo e arrastando mais duas. Até agora foram
contados 350 cadáveres e desaparecidos, metade do rio Paraopeba enlameado
ameaçando contaminar o São Francisco. Centenas de famílias perderam casas e
lavouras, milhões de peixes e animais morreram. E isso depois de três anos da
catástrofe de Mariana, que matou o Rio Doce e 19 pessoas. Até agora a Samarco/Vale
só pagou 6% dos R$250 milhões de multas do IBAMA e não entregou nenhuma casa aos
desalojados.
Existem no país cerca de 23.000 barragens de gravidade de terra ou enrocamento
com um núcleo de argila compactada, taludes internos e externos revestidos e
rede de drenos para controle de eventual erosão destinadas à geração de energia,
abastecimento de água e irrigação. São barragens calculadas e seguras. Existem
também barragens de concreto com contrafortes ou abóbadas que obedecem a outras
engenharias.
Mas existem cerca 839 barragens improvisadas de mineração no país e apenas 425
se enquadram no Programa Nacional de Segurança de Barragens, 200 delas de alto
risco. Cerca de 51% estão em Minas, 16% no Pará e o restante em outros estados.
Dentre essas estão 88 barragens de alteamento por sucessivos depósitos de
rejeitos sobre a lama viscosa de seus bordos. Cortinas de cascalho e lodo
condenadas em todo mundo. Mariana e Brumadinho eram desse tipo e existem mais 47
em Minas. Os vídeos mostram que Brumadinho não ruiu por transbordamento, mas por
colapso de sua base. Fotos e depoimentos de técnicos provam que ela estava
fissurada, encharcada e minando e a Vale foi advertida e não adotou
providências.
Quando o comandante bêbado do superpetroleiro Exxon Valdez derramou 36 mil
toneladas de petróleo nas praias do Alasca, em 1989, matando milhões de aves e
peixes, mas nenhum humano, o governo dos EUA multou a empresa em US$ 507
milhões. Em 2010, uma plataforma de petróleo da British Petroleum explodiu no
Golfo do México matando 11 técnicos, ferindo 17, e sangrando durante três meses.
Devido ao desleixo, o governo dos EUA aplicou multa de US$ 20,8 bilhões ou R$
69,7 bilhões à BP. A promotora-geral dos EUA, Loretta Lynch, disse que era uma
resposta forte e apropriada.
Em Brumadinho, o IBAMA, aplicou uma multa complacente de R$ 250 milhões, a mesma
de Mariana (não paga) e o Estado de Minas promete outra de R$ 99 milhões. Mas
não bastam multas, é preciso afastar e julgar seus diretores coniventes. O
ministro Lorenzoni, chefe do Gabinete de Crise, contrariando o Vice-Presidente
em exercício, afirmou que o afastamento da diretoria reincidente da Vale “não
seria uma boa sinalização para o mercado”. As bolsas comemoram, enquanto a
natureza e centenas de famílias choram, adoecem e não dormem!
SSA: A Tarde de 10/02/2019