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Brumas sobre o vale de la(gri)mas da Vale

  • 10 de Fevereiro de 2019

Imaginem uma barragem com 1,4 vezes a altura do Elevador Lacerda (86m) e 12.700.000 m³ de lama tóxica se rompendo e arrastando mais duas. Até agora foram contados 350 cadáveres e desaparecidos, metade do rio Paraopeba enlameado ameaçando contaminar o São Francisco. Centenas de famílias perderam casas e lavouras, milhões de peixes e animais morreram. E isso depois de três anos da catástrofe de Mariana, que matou o Rio Doce e 19 pessoas. Até agora a Samarco/Vale só pagou 6% dos R$250 milhões de multas do IBAMA e não entregou nenhuma casa aos desalojados.

Existem no país cerca de 23.000 barragens de gravidade de terra ou enrocamento com um núcleo de argila compactada, taludes internos e externos revestidos e rede de drenos para controle de eventual erosão destinadas à geração de energia, abastecimento de água e irrigação. São barragens calculadas e seguras. Existem também barragens de concreto com contrafortes ou abóbadas que obedecem a outras engenharias.

Mas existem cerca 839 barragens improvisadas de mineração no país e apenas 425 se enquadram no Programa Nacional de Segurança de Barragens, 200 delas de alto risco. Cerca de 51% estão em Minas, 16% no Pará e o restante em outros estados. Dentre essas estão 88 barragens de alteamento por sucessivos depósitos de rejeitos sobre a lama viscosa de seus bordos. Cortinas de cascalho e lodo condenadas em todo mundo. Mariana e Brumadinho eram desse tipo e existem mais 47 em Minas. Os vídeos mostram que Brumadinho não ruiu por transbordamento, mas por colapso de sua base. Fotos e depoimentos de técnicos provam que ela estava fissurada, encharcada e minando e a Vale foi advertida e não adotou providências.

Quando o comandante bêbado do superpetroleiro Exxon Valdez derramou 36 mil toneladas de petróleo nas praias do Alasca, em 1989, matando milhões de aves e peixes, mas nenhum humano, o governo dos EUA multou a empresa em US$ 507 milhões. Em 2010, uma plataforma de petróleo da British Petroleum explodiu no Golfo do México matando 11 técnicos, ferindo 17, e sangrando durante três meses. Devido ao desleixo, o governo dos EUA aplicou multa de US$ 20,8 bilhões ou R$ 69,7 bilhões à BP. A promotora-geral dos EUA, Loretta Lynch, disse que era uma resposta forte e apropriada.

Em Brumadinho, o IBAMA, aplicou uma multa complacente de R$ 250 milhões, a mesma de Mariana (não paga) e o Estado de Minas promete outra de R$ 99 milhões. Mas não bastam multas, é preciso afastar e julgar seus diretores coniventes. O ministro Lorenzoni, chefe do Gabinete de Crise, contrariando o Vice-Presidente em exercício, afirmou que o afastamento da diretoria reincidente da Vale “não seria uma boa sinalização para o mercado”. As bolsas comemoram, enquanto a natureza e centenas de famílias choram, adoecem e não dormem!

SSA: A Tarde de 10/02/2019


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