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Recuperação de centros urbanos degradados
Com o título acima foi realizado no último dia 01/08, no Centro de Convenções, um seminário promovido pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção, CBIC com apoio da FIEB e Sinduscom. Foram convidados dirigentes da CEF, dos órgãos de planejamento e preservação do Rio, S. Paulo, BH, Recife e S. Luís e das principais construtoras de retrofit. Se eu fosse um gringo sairia dali deslumbrado com o que foi mostrado: mapas, estatísticas, gráficos e belas perspectivas.
Durante as Olimpíadas a televisão mostrou vistas aéreas de Paris, um mar de construções de cinco pavimentos e no horizonte as torres corporativas de 50 ou 60 andares de La Defense. Os centros das cidades europeias não estão degradados porque elas têm planejamento.
Os oradores falaram muito da relação público/privado. Mas o privado era só o empresariado. Nenhum movimento da sociedade civil organizada foi convidado. Será possível a recuperação de nossos centros antigos sem a participação da sociedade, nem discutir as causas de seu abandono? Para o presidente da CBIC, a questão é simples: “imóveis e áreas antigas de grandes cidades são um enorme mercado” (A Tarde, 01/08/2024).
Baixei das nuvens para a dura realidade brasileira, que conheço, e a TV Globo exibe os degradados centros de S. Paulo, S. Luís, Recife e Salvador. Alguém pode imaginar que as classes média e alta vão morar em sobrados com alcovas ventiladas por um poço e sem a garagem para seus reluzentes carrões? Se por um milagre se fizesse a tão desejada gentrificação do nosso CH o que restaria ali seria apenas um cenário de pedra e cal, sem vida cultural.
O que resta de Salvador é sua cultura popular. A cidade foi desfigurada com viadutos tortos que não servem para nada. A decadência de nosso centro antigo se deve a seu esvaziamento de atividades administrativas, de serviço e comerciais por ACM para criar o Iguatemi e o CAB.
Louvável a iniciativa da Prefeitura de transferir para o Comércio algumas de suas secretarias, na ilusão que seus funcionários vão morar ali, um deserto depois das 18 horas e finais de semana. Para se repovoar o Comércio é necessário criar infraestrutura de lazer, educação, saúde e abastecimento. Resta o enigma: quem foi criado primeiro, o ovo ou a galinha?
Em 1978 em um seminário realizado aqui pelo BNH eu propus a recuperação de nossos centros antigos com programas econômicos do tipo Minha Casa, Minha Vida, pela existência ali de infraestrutura urbana (Rev. RUA, n.1, p. 35-51). Com a Profa. Márcia Santana da UFBA e seus mestrandos fizemos há cerca de seis anos uma pesquisa com algumas das 32 associações de moradores do Centro Antigo de Salvador. Todos seus diretores afirmaram que seus associados queriam continuar morando naquele local e gostariam de participar de sua recuperação. Não creio em retrofit, só nesta solução.