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A invenção do tempo

  • 29 de Outubro de 2023

já vinha desconfiando. Uma vez encontrei um indianista e ele me contou histórias fantásticas da Amazônia. Uma delas foi um índio que lhe perguntou para que servia aquela coisa que ele tinha no pulso. Ele tentou explicar o relógio e a divisão do dia em 24 horas, que por sua vez se divide em 60 minutos e este em 60 segundos com aquele ponteiro que não parava. O índio não entendia para que serviria a hora, o minuto e o segundo, pois para ele só havia o dia e a noite. Por outro lado, para Fernando, um amigo geólogo, também não existem dias, horas e minutos, senão eras.

Perguntei a ele qual era a idade dos Andes e ele me disse que são relativamente recentes, 65 milhões de anos, nada se comparado com o Monte Roraima, na divisa com a Venezuela, da era Pré-Cambriana, com dois bilhões de anos. Para os astrônomos só existem anos-luz. Radiotelescópios estão captando hoje a explosão do Big Bang ocorrida há 13,8 bilhões de anos luz e isso acontece porque ela ocorreu a uma distância imensa. Se o universo é infinito, o instante é necessariamente eterno, segundo a teoria da relatividade para quem espaço e tempo são duas faces de uma mesma moeda. As Escrituras sempre negaram o tempo, dizendo que Deus é eterno e Matusalém viveu 969 anos.

Cada cultura adota um paradigma de tempo. O Calendário ocidental foi promulgado pelo Papa Gregório XIII, em 1582, e 13 anos depois, Galileu descobriu o isocronismo do pêndulo, base do relógio moderno inventado em 1656 por um artesão de Haia, na Holanda. Nos contos das Mil e uma noites, o tempo é circular, e o descendente de um personagem pode ser o seu próprio avô. Na cultura inglesa uma empresa ou um whisky de 12 anos vale mais que o de cinco. Para os americanos é o contrário, o que vale é o up to date. Como se vê, o tempo não é absoluto, é uma invenção humana.

Com o seu pragmatismo, o capitalismo fragmentou o segundo para aumentar sua produtividade e hoje técnicos com cronômetros de alta precisão medem o tempo que um operário leva para apertar um parafuso ou se coçar numa linha de montagem inventada por Ford.

Apesar de tantas evidências, foi preciso um astrônomo italiano, Carlo Rovelli, ter a coragem de provar, como 2+2=5, que o tempo é uma ilusão humana. Vejam o Youtube da BBC O tempo não existe. Não é uma novidade, já no século XVII, o Pe. Antônio Vieira dizia o mesmo: carti”O tempo, como o mundo, tem dois hemisférios: um superior e visível, que é o passado, outro invisível que é o futuro. No meio de um e outro hemisfério ficam os horizontes do tempo, que são estes instantes do presente que imos (vamos) vivendo, onde o passado termina e o futuro começa”. Só o instante existe!

Eu, que já duvidava da fé, como Rita Lee, agora duvido também do tempo, da vida e da morte. Tudo pode ser uma fantasia do espírito.


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