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Sugestões para a reestruturação do ensino de arquitetura

  • 01 de Setembro de 1965

O presente plano de reestruturação de ensino de arquitetura tem como base os seguintes princípios:

1º) A experiência de criação arquitetônica, devidamente assessorada pelos docentes das disciplinas relacionadas com a obra de arquitetura, é responsável em, pelo menos, 50% da formação do arquiteto, tendo as aulas teóricas uma importância grande porém não superior áquela experiência. Decorre daí, a necessidade da fixação de condições idênticas de horas de aula, contagem de créditos e faltas para aprovação em um ou outro tipo de disciplina.

2º) Sendo o curso de arquitetura basicamente uma experiência de criação arquitetônica em cinco níveis acompanhado de um crescente enriquecimento de informações científicas e culturais – aulas teóricas – constitui a série a célula natural de integração do ensino em cada nível, implicando esta orientação na redução das barreiras entre disciplinas e departamentos. Segundo esta orientação, os temas de arquitetura, assim como dos seminários, escolhidos para a série, não pertencem exclusivamente a nenhuma cadeira, sendo estudados e analisados em cada um de seus aspectos por todas as disciplinas afins ao tema. Essa análise e reconhecimento do meio físico e social deve ser feita de maneira progressiva, iniciando-se com o estudo, no 2º ano, de uma gleba e nos anos seguintes um bairro, uma pequena cidade, e finalmente uma região geomorfológica e cultural, no quinto ano. As excursões deverão ser acompanhadas por professores que analisarão os aspectos físicos e sociais da área, recursos naturais, sua economia, relação com os núcleos urbanos próximos, herança cultural, etc. O tema de arquitetura, por sua vez, deverá estar relacionado com a área estudada na série.

Análise do currículo

Se analisarmos as várias disciplinas que compõem o currículo do curso de Arquitetura poderemos distinguir 3 tipos de cadeiras:

1º) Cadeira de Composição - Compreendendo todas as cadeiras relacionadas com o ato de criação da obra de arquitetura. Estas cadeiras exigem uma atitude de reflexão que não deve ser interrompida a cada hora.

2º) Cadeiras relacionadas com o projeto e a construção - São as cadeiras teórico-práticas como Higiene, Concreto, Técnica das Construções etc., cadeiras que concorrem para a elaboração do trabalho de arquitetura e cujo aproveitamento pode ser medido parcial ou totalmente naquele trabalho. Estas cadeiras serão ministradas através de aulas teóricas em auditórios, prática na sala de pranchetas ou em visita a obras.

3º) Cadeiras sem relação com o projeto e a construção - São as cadeiras teóricas ou teórico-práticas de informação científica ou cultural não relacionadas imediatamente com o Tema de Arquitetura. Nelas estão incluídas as cadeiras do 1º ano e cadeiras como Mecânica, Estética, Economia e História da Arquitetura. Estas aulas são dadas em auditórios ou em ambientes especiais como laboratórios, museus, monumentos e ateliers.
Desta análise concluímos também que as aulas teóricas, as visitas às obras, as práticas de laboratórios etc., pressupõem uma atitude mental veloz em que o aluno salta de um assunto a outro podendo estas aulas serem facilmente enquadradas em horários fixos, enquanto que o fenômeno de criação arquitetônica pressupõe uma atitude de reflexão e descobertas imprevisível, atitude impossível de ser disciplinada em horários indilatáveis.

Plano proposto

O plano consiste, basicamente, na reunião de todas as aulas teóricas, bem como as práticas não relacionadas imediatamente com o tema de Arquitetura, nos três primeiros dias da semana e criação das condições para uma experiência de criação arquitetônica total nos três último dias da semana.
O funcionamento deste plano exige:

1º) Continuidade - Durante os três últimos dias da semana a experiência de criação arquitetônica não deve ser interrompida por nenhuma aula de caráter teórico ou exercício prático do tema de arquitetura e as sessões não devem ser interrompidas por nenhum horário fixo, prolongando-se livremente até a tarde e excepcionalmente à noite.

2º) Integração horizontal - O maior número de disciplinas da série deverá
colaborar na elaboração do tema de arquitetura de cada aluno permitindo uma experiência em extensão na qual o projeto chegue aos detalhes, às instalações, às especificações e programação de obra.
Os professores de cadeiras relacionadas com o tema de arquitetura deverão exigir para nota trabalhos relacionados com o mesmo, de modo que o projeto de arquitetura conte não apenas como uma, senão, como várias notas para as diversas cadeiras. Para que este sistema possa funcionar é necessário que o tema seja escolhido com antecedência de um semestre. A partir deste momento será feita a coleta e processamento de dados por uma equipe rotativa de alunos que durante um semestre elabora os elementos para o semestre seguinte. No primeiro dia de aula de cada semestre deverá ser distribuído com os alunos apostilas com todos os elementos de programa, meio físico e social e bibliografia referente ao tema. Deste modo, cada aluno tem a oportunidade de durante um semestre dedicar-se em profundidade a pesquisa e interpretação dos dados relativos ao meio físico e ao programa social de um tema de arquitetura, discutindo em seminário com os colegas os problemas e conclusões encontrados e de dedicar-se no restante dos semestres à resolução dos problemas próprios de arquitetura. Dentro do espírito da integração horizontal, em cada um dos níveis do curso deverá o Conselho de Professores da Série programar um cronograma de todas as atividades da série. Nesses cronogramas assinalar-se-á as etapas do trabalho de arquitetura, os seminários, excursões programas e provas de aproveitamento. Visa-se, com isto, dar coerência ao ensino em cada nível e evitar o atropelo de provas e trabalhos.

3º) Integração vertical - A atuação de uma cadeira não deve limitar-se à série em que está situada, mas todo o curso. Cada professor de cadeira relacionada com o trabalho de arquitetura, além das horas dedicadas ao assessoramento de seus alunos na realização dos trabalhos de sua cadeira, deverá servir como consultor na sua especialidade para todos os temas de arquitetura que forem tratados na escola.
Durante os três últimos dias da semana deverão permanecer abertas todos os ateliers e oficinas que serão utilizados pelos alunos de todas as séries na confecção de modelos estruturais, e de topografia, estudos de volume etc., relativos ao trabalho de arquitetura. Outro exemplo de integração vertical é a comissão de reconhecimento e estudo das áreas onde serão implantados os temas de arquitetura. Esta comissão examinará, in loco, com os alunos da série os aspectos físicos e climáticos da área, sua relação com os núcleos urbanos, aspectos sociais, recursos naturais etc. Esta comissão reunirá, além do professor de Composição, os professores de Topografia e Climatologia, Urbanismo, Teoria de Arquitetura e outros que se julgar conveniente incluir.

Estruturação

Peças indispensáveis ao funcionamento do plano são os Conselhos de Professores das Séries que serão criados para desempenharem as seguintes funções:

a) – Escolha do tema de arquitetura da série, tema que deverá oferecer possibilidade de aplicação prática de exercícios das cadeiras relacionadas com projeto e construção. Para que no primeiro mês possa haver material para análise das cadeiras teóricas-práticas é necessário que se organize com antecedência de um semestre as apostilhas contendo os dados estatísticos, mapas, programa e bibliografia referentes ao tema.

b) - Organização do programa de ensino incluindo as excursões e seminários temáticos, que deverão ser realizadas com a série.

c) - Elaboração do cronograma oficial da série incluindo as etapas do trabalho de arquitetura, seminários, excursões e provas.

SSA: Jornal de Arquitetura, Diretório Acadêmico da FAUB, Ano 1, n.1, set./1965

PS – A estrutura do curso de arquitetura na época era diversa da de hoje. Assim, as “Cadeiras de Composição” correspondem as atuais “Disciplinas de Projeto” e a “série” ao “semestre”.


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