Artigos de Jornal


Metrô só não basta

  • 14 de Abril de 2013

Na semana passada Estado e Prefeitura chegaram a um acordo sobe metrô e ônibus. O problema do transito não é só de Salvador, mas aqui assume dimensões alarmantes, porque nossas vias não formam uma rede, são corredores bloqueados, sejam elas de cumeadas, de vales, ou de acessos, como a Paralela e a BR-324. O Epucs, há 70 anos, já propunha uma rede em dois níveis com cruzamentos em viadutos e túneis e alças de ligação entre os dois planos. Alguns túneis foram feitos, mas nenhuma das ligações dos dois níveis.

A questão não é só do metrô e dos ônibus. Sua solução passa pela normatização do uso do solo e mudanças de valores e hábitos. Primeiro, devemos diminuir as viagens, ou seja, todos os bairros devem ter equipamentos sociais e comércios de modo que crianças possam ir à escola e seus pais ao supermercado sem precisar de transporte. Segundo, ela implica na compreensão que a era do carro foi linda, podia-se namorar e passear de baratinhas, mas já era. Se pensarmos a cidade sem eles, se abrem novas perspectivas e teremos uma cidade mais ligeira e socialmente mais rica.

Tomo como exemplo de Copacabana, no Rio. Sua arquitetura de especulação, dos anos 30 e 40, é muito ruim, mas seu urbanismo dez. Depois de ter lido “Uma utopia urbana” do antropólogo Gilberto Velho e assistido “Edifício Master” de Eduardo Coutinho mostrando a vida nos quarto-e-sala do bairro, acabo de redescobrir seus valores de urbanidade, já cantados por Braguinha, Caymmi e Drummond. Experiência vivida, pois tenho um filho morando ali, num sala e três quartos.

Poderia classificá-lo como um bairro pré e pós-calhambeque. Poucos edifícios têm garagem, mas não faz falta, pois existe um metrô. Vai-se andando para o supermercado, para levar o neto na escola, para o restaurante, o calçadão, este espaço de sociabilidade e lazer, e a praia. Com isso, economiza-se a academia e chega-se ao centro em poucos minutos no metrô. São Paulo, a exemplo de cidades europeias e de Nova York, depois de tentar o rodizio, que só aumentou a frota, acaba de proibir o carro na área central, tornando as viagens de ônibus meia hora menos demoradas. Ha meios para diminuir a frota de carros em circulação. Nova York com um enorme metrô não permite novas vagas na ilha e cobra pedágio para entrar.

Não seria tão radical, mas consideraria as garagens como área construída para efeito de coeficiente de aproveitamento (CAM) e taxação. Com isso diminuir-se-ia a frota e os estoques de transcon, ao tempo que aumentaria a arrecadação para investir na melhoria urbana. São medidas duras, como a dieta e a malhação, mas necessárias para ter uma barriga sarada.

Desconstipar Salvador significa criar um novo paradigma de mobilidade coletiva e restrições ao carro. O novo paradigma compreende transportes de qualidade – metrô, VLT e BRT - e sistemas alternativos de circulação, como ciclovias, hidrovias, passarelas, teleféricos e ascensores. Estes são fundamentais em uma cidade com três níveis e foram os primeiros coletivos da cidade, ainda no século XVII, modernizados na era industrial, com guindastes, charriots e parafusos, hoje sendo desativados.

Esses equipamentos não têm uma única solução. O novo metrô pode ser em trincheira, ao nível do solo ou aéreo. A primeira solução evita os impactos sonoros e visuais, mantem o verde e elimina viadutos, mas pode não ser o preferido das empreiteiras. Os VLTs e BRTs de alimentação do metrô devem ser de paradas locais e expressas. Ônibus podem ter assoalho rebaixado e rotas diretas, ou chassi elevado de caminhão e trajetos labirínticos. Mas a primeira hipótese pode não ser a preferida do SETPS. Estas são alternativas técno-sociais que interessam aos cidadãos e que precisam ser discutidas em fóruns representativos e qualificados de toda a cidade e não em audiências enganosas na periferia.

Precisamos, em suma, desprivatizar Salvador colocando empreiteiras, imobiliárias e concessionária no seu lugar, servindo e não garoteando a cidade e remover o lixo do PDDU, do Lous e do Código de Obras.

SSA: A Tarde, 14/04/13


Últimos Artigos