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O barato sai caro e não funciona

  • 10 de Novembro de 2013

Tenho um amigo engenheiro, brilhante, mas muito crédulo. Numa mesa de bar contei-lhe que soube que diante das criticas, o Governador havia consultado um especialista que trabalhou na implantação das linhas do metrô paulistano. Este, depois de sobrevoar a cidade, ler relatórios e entrevistar muita gente demonstrou como 2+2 = 4 que o metrô é uma boa ideia, mas está no lugar errado. O colega arregalou os olhos. Disse-lhe: vamos convir que com a Linha 2, recentemente licitada, o metrô deixou de ser um transporte urbano para ser um trem suburbano, uma ligação de Salvador com a Região Metropolitana, como o trem da Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Mas ao contrario do carioca, este passaria por uma faixa desabitada da cidade, a Av. Paralela.
O consultor demostrou que esta diferença provocaria dois efeitos: torná-lo insustentável e não tirar nenhum automóvel das ruas e 70 a 85 % de seus usuários virtuais deveriam ser trazidos de ônibus de outros bairros e só um número reduzido de cidadãos iria se sujeitar a fazer dois ou mais transbordos para chegar ao trabalho. Insustentável também por ter um custo operacional alto, como trem de superfície numa avenida cheia de “sobe e desce”. Teria principalmente um custo social muito alto, por dividir a cidade com alambrados segregando os mais pobres do “Miolo” dos mais ricos, que já se auto-segregam em condomínios fechados na Orla Atlântica. Provocaria, ainda, a desvalorização dos imóveis da Av. Paralela pelo impacto do ruído e destruição de um parkway de 13 km de extensão.

- E onde deveria ser feito o metrô, perguntou o amigo? - Segundo esse consultor, o mais logico seria na Linha Viva, que passa por bairros populosos como Saramandaia, Saboeiro, Arenoso, CAB, São Marcos, Cassange, Trobogy, Mus surunga e Itinga. Lembrei ao amigo que o Plano Metropolitano de Desenvolvimento, Conder/1977, já recomendava esta trajetória. Na inauguração ele já teria assegurado 40 % de sua capacidade plena, sem transbordos de passageiros. O fato de essa trajetória ser uma verdadeira montanha russa, com cabos de alta tensão que saltam de uma cumeada para outra, não chega a ser um empecilho, senão uma vantagem.
O metrô poderia correr nivelado, com baixo consumo de energia, à meia altura com trechos em túnel e outros em viaduto. Com esses se asseguraria permeabilidade e a comunicação entre a banda leste e a oeste da cidade. Assim, não seria necessário deslocar nenhuma comunidade. Naqueles trechos ainda desocupados poder-se-ia fazer operações urbanas consorciadas, como se faz em todo projeto de metrô, financiando parte da obra.

- Em que consiste isso? - Consiste em aproveitar a mais valia do solo com a implantação dessa infraestrutura, respondi. - Então faltou estudo? - Não, o plano da Conder- EUST, de 1977, previa um metrô subterrâneo revitalizando sem danificar a área central mais importante da cidade e seguindo para o norte. - E por que o Governo escolheu a Paralela para colocar esse trem suburbano? - Por ser a solução supostamente mais barata, mas não funcionará, respondi. - E para descongestionar a Paralela, o que ele recomenda? - Reservar duas faixas da sua pista para um BRT (Bus rapid transit) que é mais flexível e capilar que o metrô. Ele poderia recolher passageiros em Itapuã e nos loteamentos próximos entrar na faixa expressa do BRT e chegar rápido ao centro. Depois de uma semana, os que ficaram presos em seus carrões no trânsito preferirão o frescão.

Quando percebi que o amigo já se preparava para divulgar a boa nova em uma rede social, bateu-me o sentimento de culpa. Olhando em seus olhos lhe disse: - acorda amigo, isto é uma brincadeira. O governo não consultou ninguém, foi mal assessorado, mas não vai mudar nada. Tudo o que eu lhe disse é um sonho! - Mas é tão real que não pode ser uma quimera, este sim é um barato. Depois de alguns minutos em silencio, resmungou um palavrão e disse: - na política o que importa não é o fato, mas a versão, e a licitação ainda não foi aprovada pelo TCE. – Seu garçom pendure esta conta no cabide ali em frente!

SSA: A Tarde de 10/11/13


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