Artigos de Jornal
Perguntas frequentes
O manual do usuário de qualquer produto novo apresenta três seções: para que
serve o produto? como funciona? e perguntas frequentes. Na falta das duas
primeiras, me antecipo respondendo algumas perguntas frequentes. A ponte
Salvador/Itaparica que parecia morta foi relançada com o anuncio do governador
de licitá-la antes de deixar o governo e novas contratações de pareceres e
projetos para justificar uma decisão tomada em reunião social sem qualquer
estudo prévio.
1º - A ponte faz parte do sistema viário de onde? Uma ligação
rodoviária não pode competir com uma ferrovia como a Fiol na exportação de
minérios e grãos do oeste, mesmo porque o porto de Salvador não opera graneis.
Não serve também ao litoral sul, quando está sendo construído o Porto Sul e um
novo aeroporto em Ilhéus. Atrações como Itacaré e Barra Grande são mais
acessíveis por Ilhéus.
2º - A ponte substituirá a hidrovia? – Os moradores de Niterói sabem
que é melhor pegar a barca e saltar no centro do Rio que enfrentar filas,
engarrafamentos e pedágio e não poder estacionar no Rio. Os ferries vão
continuar transformados em barcas de passageiros.
3º - A ponte será um escape ou ladrão para Salvador? Quem atrai mais:
Salvador ou Nazaré? A ponte irá apenas congestionar Salvador e a Estrada do Côco
trazendo os veículos da BR-101 e BR-116 para o litoral norte onde estão o
aeroporto, praias, Copec, Ford e acesso ao Nordeste. Quem perde com isso é S.
Antonio de Jesus, Salvador e Feira de Santana. A ponte irá ainda duplicar a RMS
aumentando sua função de dormitório e prestador de serviços de educação, saúde,
abastecimento e lazer para trabalhadores que enriquecem outros municípios. A
solução tem que ser ferroviária, pois a ponte será tão engarrafada quanto a
Paralela.
4º - Itaparica será uma expansão de Salvador? A classe média quer
centralidade, ficar junto do emprego, dos colégios e universidades, dos
hospitais, do teatro e dos cinemas. Também não tem lógica criar conjuntos
habitacionais para operários que irão trabalhar em Candeias, Simões Filho e
Camaçari, sujeitos a esperar horas para a passagem de plataformas de petróleo e
guindastes. A Ilha será apenas um acampamento rodoviário como São Gonçalo junto
a Niterói.
5º - A ponte beneficiará a RMS e o Recôncavo? Saltando de Salvador
para Jaguaripe a ponte irá marginalizar ainda mais o Recôncavo com seu enorme
potencial turístico e náutico. A baía também perde com um gargalo na sua boca
dificultando o acesso a seus quatro portos internos: Aratu, Temadre,
Regaseificação e Estaleiros de S. Roque.
6º - Qual a importância econômica da ponte? Se não serve ao oeste. ao
sul ou a RMS o que ganha o estado com esta ponte rodo-eleitoral? Não sabemos
responder. Mas “Pergunte ao José”, saudoso programa radiofônico baiano.
7º - Quanto pagaremos pela ponte? Todos sabem que uma ponte não se
paga pelo pedágio. A solução apontada de leilões de CEPACs não está funcionando
nem no Porto Maravilha, no centro do Rio. Sem esquema financeiro assegurado, ela
será iniciada e parada e as empreiteiras irão receber durante anos por terem seu
contrato suspenso como aconteceu com o metrô perna-de-pau de Salvador. Mesmo que
a União banque uma parte, teremos que pagar uma divida monstruosa, o equivalente
a quatro superportos tipo Mariel em Cuba, ou três refinarias de Pasadena, ou
ainda as doze arenas da Copa, enquanto o sertanejo, a lavoura e o gado morrem de
sede no semiárido.
8º Não haveria uma alternativa mais interessante? Sim, seria a
construção da Envolvente Rodo-Ferroviária de Kerimorê ou BTS, ligada ao novo
porto de Salinas da Margarida, projeto que custaria um terço da ponte e teria
efeitos socioeconômicos e culturais muito maiores. Ela alavancaria o
desenvolvimento do Estado e da RMS e integraria todo o Recôncavo com um trem
rápido metropolitano fazendo a ligação Salvador-Feira com variante para São
Roque/Itaparica. E ainda reduziria para um terço o acesso de carros para a ilha
e criaria milhares de empregos perenes.
P.S. - Não confundir “Pergunte ao José” do mestre Cid Teixeira com “José”,
poema de Carlos Drummond de Andrade.
SSA: A Tarde, 11/5/2014