Artigos de Jornal
A desastrada cultura do M.D.C.
Contava-me um sócio de uma construtora média que encontrou no escritório um
colega que se inscrevia para uma vaga. Pediu para ver o currículo e perguntou
por que ele não mencionava os cursos e os títulos de pós graduação. – “Porque
preciso do emprego e se os menciono não serei nem entrevistado”. Contando isso a
um grupo de amigos eles disseram que seus filhos foram aconselhados a fazer o
mesmo. A grande empresa está trocando profissionais qualificados por recém
formados porque ganham menos e se sujeitam a tudo. Por falta de tecnologia nossa
indústria perdeu competitividade e nossas exportações são cada vez mais de
commodities sem valor agregado.
Licitações milionárias são feitas com projetos-básicos sem engenharia. Quando
uma refinaria orçada em US$ 2 bilhões, como a Abreu e Lima, chega a US$18 bi e
não está na metade não é só corrupção, é incompetência e descontrole total.
Cerca de 80% de suas obras foram feitas em regime diferenciado de contratações
RDC, onde não se pede nem projeto-básico. Hugo Chaves se deu conta a tempo e
tirou o cavalinho, ou melhor a PDVSA, da chuva. Raul Castro não fez o mesmo
porque cavalo dado não se olha o dente.
Neste mesmo regime a Copa de 2014 custou a soma das três últimas e nenhuma das
obras de mobilidade ficou pronta. É inadmissível que um viaduto caia antes de
inaugurado e dois outros estejam interditados (B.H. e Cuiabá) ameaçando cair. O
desabamento de um túnel na transposição do São Francisco foi considerado pelo
fiscal uma ocorrência normal neste tipo de obra. Isto ocorre porque os órgãos
públicos funcionam com contratados REDA, não abrem concurso e poucos têm planos
de carreira.
Nossas universidades estão cheias de professores substitutos, temporários e sem
experiência. Para um professor chegar a titular, hoje, não precisa mais fazer
concursos de progressão, nem haver vaga, basta ser doutor, ter tempo de serviço
e apresentar um memorial. Muitos desses doutores depois do título não escreveram
um só artigo. Não é de estranhar que o Brasil, com quase a metade da população
da América Latina, não tenha um Nobel, enquanto os hispânicos têm vinte.
A meritocracia foi abolida do serviço público. Seu sucedâneo é o aparelhamento e
a improvisação. O planejamento público foi reduzido ao orçamento. Uma colega
funcionaria me disse que fez uma atualização em gestão e comentou com o
professor a falta de planejamento das obras. O professor disse que planejamento
de estado é coisa do passado, da ditadura. “Estamos fazendo hoje mais
planejamento que nunca. As empreiteiras planejam e trazem os projetos-básicos
com as licenças ambientais já aprovadas para licitar”. As cinco irmãs não dão
prego sem estopa, são todos projetos carimbados. O resultado são obras ruins,
superfaturadas, aditadas e desarticuladas. Muitas não servem para nada e foram
abandonadas.
Jorge Amado tinha razão, este é o país do carnaval. Nessa linha não vamos a
lugar nenhum. Precisamos superar o complexo de vira-lata e a pratica dolosa do
M.D.C. - mínimo denominador comum – e perseguir a excelência e a eficiência para
erradicarmos a pobreza e construirmos uma nação desenvolvida. Joãozinho Trinta
também tinha razão.
SSA: A Tarde de 18/01/15