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A classe média abre alas

  • 13 de Julho de 2019

Segundo o SAE e a revista Valor, a classe-média brasileira representa 54% da população. Ela cresceu pela concentração de renda que empobreceu os remediados e incorporou ao consumo camadas mais baixas. Formada por profissionais liberais, funcionários públicos e privados e pequenos comerciantes ela é a classe mais afetada pelo desemprego, devido ao avanço cibernético, à reengenharia das empresas e à flexibilização do trabalho. Criou-se, inclusive, novas categorias de desemprego: subocupação e desalento, dos desesperançados de trabalharem. Com a chegada da inteligência artificial e do 5G vão acabar muitas profissões, inclusive a de “uberista”, placebo da classe-média.

A abertura do mercado barateia os importados, mas acaba com o emprego nos países subdesenvolvidos. Nesse quadro, só os desenvolvidos ganham. Já são milhões de diplomados no 3º mundo que não conseguem trabalho. Nunca se viu tanta gente enfrentando a morte para fugir da fome. Se continuarmos como exportadores de comodities no futuro só teremos ocupação para um punhado de TIs, e informais de manutenção, como pedreiros, mecânicos e faxineiras.

Essa população está desesperada. Perdeu o emprego, teve que botar os filhos na escola pública e entrar na fila do busu e do SUS. Eles já não dormem, não podem consumir uma cervejinha e um cigarro e não aceitam as novas relações de gêneros. A maioria não entende o que está acontecendo, e se apega a astrólogos, à compra de milagres, à autoajuda e à automedicação. Seu sonho é fugir do país, abolir as multas de trânsito, baixar o imposto do cigarro e ter uma arma, sem saber atirar. Não é de se estranhar o aumento do feminicídio, muitas vezes seguido de suicídio, a proliferação das farmácias e do consumo de Rivotril. O bloco da classe-média subiu ao palco, e agora? Mas como ativar a economia sem empregos e aplacar a mágoa de um exército de excluídos? Drummond retratou o drama de um de seus membros em versos, quer vão aqui resumidos?

“... A festa acabou,/ a luz apagou,/ o povo sumiu,/ a noite esfriou,/ e agora, José?/ e agora, você?/ você que é sem nome,/ que zomba dos outros,/ você que faz versos ... / Está sem mulher,/está sem discurso,/está sem carinho,/ já não pode beber,/ já não pode fumar,/ cuspir já não pode,/ a noite esfriou,/ o dia não veio,/ o bonde não veio,/ o riso não veio,/ não veio a utopia/ e tudo acabou/ e tudo fugiu/ e tudo mofou,/ e agora, José?/...Se você gritasse,/ se você gemesse,/ se você tocasse/ a valsa vienense,/ se você dormisse,/ se você cansasse,/ se você morresse.../ Mas você não morre,/ você é duro, José!/ Sozinho no escuro/ qual bicho-do-mato,/ sem teogonia,/ sem parede nua/ para se encostar,/ sem cavalo preto/ que fuja a galope,/ você marcha, José!/ José, para onde?” Esse é o dilema da classe-média.

SSA: A Tarde de 13/07/2019


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