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A crise da Odebrecht

  • 06 de Outubro de 2019

É lamentável o que ocorreu com a maior empresa de engenharia do país. Nunca trabalhei nela, mas acompanhei seu salto de uma pequena empresa local e familiar, de Dr. Norberto, Chico Valadares e Otto Schaeppi, a uma transnacional com obras em 35 países, atuando na engenharia de ponta, prospecção de petróleo, química, mineração, agroindústria e em programas sociais e culturais.

Quando a Odebrecht completou 40 anos, em 1985, Dr. Norberto publicou um texto no seu boletim em que analisava as quatro grandes crises por que ela passou e as lições que delas tirou: “Hoje, após quarenta anos de crises, oportunidades e riscos, o sistema de comunicação nos vários níveis de gestão da organização a tem levado a atingir a maturidade... Exige, no entanto, que nos empenhemos a fundo na formação da terceira e quarta gerações”. E foi nisso que a empresa falhou. Naquele momento, a empresa se expandia no exterior e a ambição desmesurada e a falta de uma visão geopolítica da terceira geração a atolou na corrupção e no enfrentamento de uma guerra comercial e estratégica desigual.

A Odebrecht não só forçou o fechado mercado americano, em 1991, como começou a atuar em países que não lhe eram gratos, como Angola. Argélia, Cuba, Irã, Iraque e Venezuela. Para complicar, criou uma divisão bélica, sendo responsável por 49% do projeto de fabricação de cinco submarinos, um deles nuclear, no Brasil, com tecnologia francesa. Em 2010, a Odebrecht aliou-se à European Aeronautic Defense and Space para fabricação de aeronaves, mísseis e sistemas de vigilância. Um ano depois, assume o controle da Mectron, a maior fabricante brasileira de mísseis (Le Monde Diplomatic, set. 2019).

A resposta não tardou. O Ministério da Justiça dos EUA publicou a lista das parcelas dos US$ 788 milhões que a Odebrecht e a Braskem pagaram a autoridades de países da America Latina, inclusive Brasil, África e Oriente Médio, embora não revelando quem recebeu a propina e lhe impôs um acordo de leniência de US$ 3,5 bi a ser pago aos EUA, Brasil e Suíça, a maior multa por corrupção já gravada no mundo (G1, 21/12/2016).

Triste que descendentes acusem o fundador morto e colaboradores vivos para diminuírem suas penas e evitar os grilhões eletrônicos. No Primeiro Mundo, se prende os responsáveis, mas se preserva a empresa. Aqui ocorre o oposto. Triste que uma empresa renuncie a seu nome, sob pressão de um procurador que admite ter obtido ilegalmente dados da Suíça e Mônaco para pressionar delatores contra ela (Poder 360, 27/09/19). Com um passivo de R$98,5 bi, parece difícil, porém não impossível, que a fênix possa, mais uma vez, ressurgir das cinzas, mas nunca voltará a ser a Odebrecht de Dr. Norberto, como a “Conceição” de Cauby Peixoto, que tentando a subida desceu...

SSA: A Tarde, de 6/10/2019


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