Artigos de Jornal
Aviso aos navegantes
Antes de ser extinta a cabotagem nos 8.000 km de costa do país e a Hora do
Brasil se transformar em a Voz do Brasil, havia na primeira um quadro com o
título Aviso aos Navegantes que informava, tanto aos capitães de longo curso
quanto aos viajantes de primeira viagem, sobre as condições atmosféricas e do
mar. Este serviço evitou muitos naufrágios e afogamentos. Não sou um
meteorologista, mas desde cedo gostei de observar as nuvens e dar palpites sobre
o uso do guarda-chuva.
Depois do aquecimento global as previsões ficaram mais difíceis. As estações já
não são as mesmas. Tem havido precipitações tempestuosas de “altostratus” e
formação de nuvens baixas, que poderiam ser classificadas de classe C. Estas
nuvens ainda sob a forma de vapor penetram em tudo, bancos, shoppings centers e
supermercados como gafanhotos consumindo tudo. É o fenômeno conhecido como
“inversão”, em que as camadas mais baixas se elevam aprisionando a poluição e
afetando os condomínios mais altos.
Nossos prefeituráveis ainda não se deram conta do fenômeno, que pode afetar a
previsão do tempo nas próximas eleições. O quadro climático desta eleição não é
o mesmo de há uma década. A classe C, que faz cursinhos, navega na internet e no
asfalto, não quer só pão e regue, quer transporte de qualidade, trabalho,
segurança e cultura. Já não se ilude com quimeras como Salvador Capital Mundial,
anúncios de obras faraônicas e a salvação da cidade pela Copa do Mundo. Quer
respostas claras e urgentes para os seus problemas.
Por outro lado, os partidos perderam a identidade e se baratinaram. A classe
política está desacreditada depois de tantos escândalos. O velho falsete dos
marqueteiros políticos de não divulgar o programa de governo para não expor o
fraco candidato a um debate televisivo já não funciona. Candidato sem programa e
com discurso generalista, didático e nostálgico não terá vez. O que o eleitor
quer é a discussão dos seus problemas, ser ouvido e debater novas propostas.
Enfraquecidos, os partidos enfrentam um dilema e caem num circulo vicioso. O
pouco que resta de compromisso social vem sendo minado pelo fisiologismo, pela
corrupção e pelo aparelhamento na sua competição desesperada pela sobrevivência.
Compromisso social sem competência para transformá-lo em ganhos sociais se
transforma em um saco vazio. Enfrentar os complexos problemas de uma cidade como
Salvador sem recursos e dominada por grandes cartéis, não pode ser tarefa
exclusiva dos limitados quadros partidários e dos patrocinadores. E quando a
tripulação falha o barco afunda.
A mídia também mudou. O marketing e a propaganda política gratuita viraram uma
mesmice que ninguém mais escuta e acredita. A televisão cedeu lugar às mídias
sociais, que permite o dialogo do cidadão com o cidadão e com o governo, sem a
intermediação dos partidos. Mídias que permitiram a eleição de Obama com muitos
votos republicanos e está provocando o fenômeno, ainda pouco claro, da Primavera
Árabe. Todos sabem que a classe media não faz revolução, mas faz a cabeça das
classes D e E e as três juntas estão fazendo uma revolução silenciosa.
Ninguém está mais disposto a dar um cheque em branco a um político que depois de
eleito esquece os compromissos. Hoje o eleitor cobra do governante seu
desempenho até seu ultimo dia de mandato, como estamos vendo com o movimento
Desocupa Salvador. E não será diferente com o novo prefeito. Tirar Salvador do
buraco em que se encontra requer que o novo prefeito mobilize todas as forças
sociais da RMS e tenha prestigio para conseguir do Estado e da União os recursos
financeiros e humanos que ela precisa. A questão de Salvador é fundamentalmente
uma questão metropolitana e só se resolverá com um prefeito articulado.
Poucos prefeituráveis se deram conta que a eleição já está em curso, em
discussões nas associações de defesa da cidade, no facebook, nos bairros, nos
sindicatos e nos conselhos profissionais. Este é um duplo aprendizado, para os
candidatos e para a comunidade. Chacrinha já dizia: quem não se comunica se
trumbica!
SSA: A Tarde, 08/04/2012