Artigos de Jornal
Kirimorê pede socorro
Durante o período colonial e século XIX a Baia de Todos os Santos e seu
recôncavo foram o sustento da Província da Bahia. Por ela passava toda a
produção de açúcar, fumo, farinha e pescado de suas margens e de carne seca,
couro e minérios do sertão através dos portos de São Feliz, Cachoeira, Santo
Amaro e Nazaré. Reunida esta produção no porto da Bahia (Salvador) ela era
exportada para a Europa, África e Oriente. Por aqui passava, também,
praticamente todo o comercio da metrópole com seu vasto império marítimo.
Sua importância começa a decrescer com a unificação da rede ferroviária e
abertura de estradas de rodagem na década de 20 do século passado, quando nós
rodo-ferroviários, como Feira de Santana e Alagoinhas, roubam daquelas cidades a
função de ligar Salvador com o resto do estado e até com o Piauí e Minas Gerais.
Esta alteração nos transportes somada à crise da economia açucareira poria
aquelas cidades-portos, outrora florescentes, na marginalidade e seu rico
patrimônio cultural na ruina. Nem a exploração e refino do petróleo de seu
recôncavo e aguas, a partir dos anos 50 da centúria passada, tiraria a bela
Kirimorê da letargia e da marginalidade.
Na próxima terça feira, a Associação Comercial da Bahia em boa hora realizará o
seminário “Baia de Todos os Santos: investimentos, perspectivas e integração com
a RMS”. Estão, de fato, previstos grandes investimentos na baia, como os
estaleiros de São Roque e Mapele, dragagem ou ampliação dos portos de Salvador,
Aratu e Madre de Deus, além da Estação de Regaseificação da Petrobras, em meio
às águas da baia.
Um último grande investimento, a polêmica ponte Salvador-Itaparica, na boca da
baia, ainda está incerta. Além de enormes impactos ambientais, urbanos e na
navegação marítima, o esquema de venda de Cepacs para captação dos sete bilhões
de reais necessários a sua construção é aparentemente inviável. Sujeita a
paralizações por horas para a passagem de plataformas de petróleo, está ponte
que complica a navegação e a transito rodoviário poderá trazer benefícios ao sul
do Estado, mas sujeitará o Recôncavo a um maior isolamento e Feira de Santana a
perder parte de seu movimento comercial.
Os demais investimentos são empreendimentos de alta concentração de capital e
tecnologia só acessíveis a grandes empresas estatais ou privadas. Tais
investimentos poderão repetir o ciclo da exploração e refino de petróleo e da
petroquímica na Bahia, que não trouxe nenhum benefício ao Recôncavo tradicional.
Mas há outro potencial econômico inexplorado e de maior beneficio
socioeconômico, o do turismo náutico e histórico na Baia de Todos os Santos e
Recôncavo, que não está sendo considerado pelas autoridades. Para que isto de
realize, basta interligar as rodovias asfaltadas que já existem no fundo da
baia, ligar São Francisco do Conde a Aratu por uma via costeira e construir
pontes sobre a foz do Paraguaçu e ligando Salinas das Margaria à Ilha de
Itaparica.
Assim estaríamos dando nova vida a cidades históricas de S. Francisco do Conde,
Santo Amaro, Cachoeira e S. Felix, incentivando o empreendedorismo no campo do
turismo e esportes náuticos, da pesca, da maricultura, de resorts e marinas e a
criação de pequenos estaleiros de barcos e lanchas. Resolveríamos também o
problema do sistema de ferry boats, que só não funciona na Bahia.
Paralela à via turística deverá ser criada, em uma segunda etapa, uma ligação
rodo-ferroviária situada mais para o interior para evitar impactos ambientais
articulando os portos e centros industriais que existem nas margens da baia,
como o COPEC, o CIA, o porto de Aratu, a RELAN, o Temadre, a Estação de
Regaseificação e os estaleiros de São Roque e Mapele ligando-os às BRs 101 e 116
e à Ferrovia Oeste-Leste. Projeto que teria a mesma função do Arco Rodoviário do
Rio de Janeiro de integração de portos e indústrias e proteção da cidade do
transito de veículos pesados.
Espero que este seminário contribua para a efetiva requalificação da Baia de
Todos os Santos e do Recôncavo. Kirimorê não pode morrer, nem ser amordaçada.