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Os percalços do planejamento privado

  • 02 de Março de 2014

O planejamento público foi extinto com a tese neoliberal da desregulamentação e redução do estado do Terceiro Mundo e o interesse dos partidos no aparelhamento. Os projetos passaram a ser feitos pelas empreiteiras que executariam as obras e as exploriam. Ao estado caberia apenas financiar. Foi assim na Fonte Nova e será em outros projetos anunciados. Com essa política as grandes construtoras incorporaram as empresas de planejamento para elaborarem projetos básicos que são oferecidos ao poder publico e dessa maneira pegarem as obras.

É ingênuo pensar que por trás desses projetos ofertados não exista um plano mais ambicioso. No caso de Salvador fica evidente que o plano é a blindagem da área mais valorizada da cidade, a orla do Atlântico. A blindagem se faz com a criação de barreiras intransponíveis de segregação social, como a Via Expressa e o trem suburbano da Paralela, e o final do metrô na Lapa. Aquelas duas vias formam uma barreira de cerca de 20 quilômetros, que se inicia em Água de Meninos e chega a Lauro de Freitas.

Desenhadas pelas empreiteiras, sem o crivo técnico do estado nem de audiências públicas, esses projetos são inadequados, superdimensionados e de prioridades duvidosa. São projetos carimbados apresentados como sendo a única solução viável, legitimados através de Procedimentos de Manifestação de Interesse sumários.

Como exemplo de via inadequada que não liga, senão segrega, temos a Linha 2 do metrô na forma como foi licitada. Ela será apenas uma ferrovia suburbana de ligação de Salvador a Lauro de Freitas e no futuro a Camaçari e irá destruir o canteiro central da Av. Paralela e perturbar o sono de seus moradores. Correndo entre alambrados ela dividirá a cidade no meio. Ao nível do solo nenhuma passagem para carros ou pedestres, apenas viadutos sem passeios ligam as duas partes. Seus moradores e usuários só despertarão quando seus imóveis valerem a metade e não ha mais jeito.

A Via Expressa é um exemplo de obra super-dimensionada para superfaturar. Concebida como uma via portuária de duas faixas ela foi transformada inexplicavelmente em uma estrada de dez faixas, três tuneis e 14 viadutos que não conseguiu resolver o engarrafamento da rotula do Abacaxi. A Via Expressa não é uma avenida urbana, é uma autopista seccionando a cidade, sem passeios, passarelas, sinalização, nem arborização. É mais uma barreira para separar a cidade pobre da rica promovendo segregação e violência. Cerca de R$420 milhões foram gastos em beneficio do carro, e nenhum real em favor de modais públicos, do do pedestre e da melhoria da qualidade de vida urbana.

Outro exemplo de super-dimensionamento são as obras de articulação da Paralela com o Imbui. Onde bastaria um trevo de duas folhas, mais simples que as tesourinhas de Brasília, estão sendo feitas duas vias elevadas com três quilômetros ao custo de R$ 65 milhões. Enquanto isto, o plano de ciclovias para Salvador elaborado pela Conder orçado na metade desse preço mofa nas gavetas.

Por fim, volta a ser anunciada a licitação da Ponte Salvador-Itaparica, obra estimada inicialmente em R$ 7,5 bilhões, que não servirá para muita coisa. Não trará a soja e o minério do Oeste, pois já existe a Fiol, não beneficiará o Recôncavo porque saltará de Salvador para Jaguaripe e não substituirá o ferry boat como a ponte do Rio- Niterói não eliminou as barcas. Com este dinheiro se poderia construir 200 mil habitações populares e eliminar todo o déficit habitacional do estado.

Isto ocorre quando o Governo Federal corta R$ 44 bilhões de seu orçamento e o estado pede a antecipação de quatro anos de royalties da Petrobrás para fechar o caixa. Não chega a ser um problema para as empreiteiras. Iniciadas as obras e em seguida paralisadas, elas continuarão recebendo dinheiro para não fecharem os canteiros. A Linha 1 do metrô de Salvador é um bom exemplo de duplicação de custo, redução da obra à metade e inatividade por força deste dispositivo contratual. Não dá para entender!

SSA: A Tarde, 02/03/14


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