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O fim da propaganda vazia

  • 28 de Setembro de 2014

Não me recordo de um campanha eleitoral mais perturbada e aguerrida como esta, continuação aparente de um movimento político-social iniciado em junho de 2013 e sem prazo para terminar. Será este movimento resultado da expansão da classe C e rebaixamento da classe média. Se for, PSDB e PT responsáveis por esse processo são vítimas de fogo amigo. Esta insatisfação se deve à falência do sistema representativo. Para o público os quase 40 partidos são todos farinha do mesmo saco. Nenhum candidato a presidente, governador, deputado ou senador apresenta proposta nova. Ninguém se lembra em quem votou para deputado ou senador, nem se sentiu representado.

Com processos eleitorais independentes, presidente e governadores também não têm a fidelidade de seus legislativos. Só governam se cooptarem os partidos da base. E esta cooptação obedece à Lei de Gerson criando-se um círculo vicioso. Isto fica evidente quando constatamos que o custo das campanhas para serem bem sucedidas ultrapassam em muito os ganhos salariais auferidos durante o mandato. Os que não seguem esta prática dificilmente são eleitos. Representar o “povo” virou um negócio de família, que no caso da Bahia chega a três gerações.

A atual campanha exemplifica claramente estes fatos. Os programas partidários ficam apenas registrados no TER. Nas campanhas majoritárias apenas promessas genéricas: melhorar a educação, a saúde e a segurança com mais investimento, mas sem dizer como. Nas companhas legislativas nem isso, apenas uma foto colorida e um número. Para os marqueteiros é preciso não se comprometer com nada, para não ser contestado. Assim, a propaganda dos senadores e deputados é toda igual e mais parece uma campanha da Kolynos. Cerca de 99% dos candidatos exibem reluzentes dentaduras e um numeral, que não chegamos a gravar. Preferia o velho e barato santinho, que guardávamos no bolso para a hora da votação.

Em Salvador esta campanha imagética chega a saturação nas avenidas de vale e na Paralela. A indústria gráfica agradece a campanha multimilionária. Até quinze fotos do mesmo candidato em fila rindo, ninguém sabe de que ou de quem. Em São Paulo cartazes estão proibidas, no Rio, Brasília e demais capitais eles são raros. Dirão que o tempo na televisão é mínimo e nos cartazes, devido à velocidade dos veículos, ninguém lê. Marqueteiros mais criativos poderiam associar o retrato do candidato com sua plataforma: um médico com um estetoscópio, um defensor da Petrobrás com o capacete da companhia, um indignado com uma vassoura. Apenas um boxer aparece com suas luvas e dois candidatos com cachorrinhos.

Darcy Ribeiro dizia que não existia um cabrito abandonado neste pais, mas as sinaleiras de nossas cidades estavam cheias de crianças abandonadas. Ninguém se propõe ser o protetor das crianças ou do hospital da Irmã Dulce. Na Itália quando fiz um doutorado a justiça eleitoral colocava painéis nos principais pontos das cidade onde os candidatos colavam pequenos cartazes (A4) com sua foto e suas plataformas eleitorais. A única propaganda inovadora desta campanha é um retrato em branco e preto de um candidato inspirado nos versos de Chico: “Já conheço os passos dessa estrada e...”

SSA: A Tarde de 28/09/14


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