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O fim da propaganda vazia
Não me recordo de um campanha eleitoral mais perturbada e aguerrida como
esta, continuação aparente de um movimento político-social iniciado em junho de
2013 e sem prazo para terminar. Será este movimento resultado da expansão da
classe C e rebaixamento da classe média. Se for, PSDB e PT responsáveis por esse
processo são vítimas de fogo amigo. Esta insatisfação se deve à falência do
sistema representativo. Para o público os quase 40 partidos são todos farinha do
mesmo saco. Nenhum candidato a presidente, governador, deputado ou senador
apresenta proposta nova. Ninguém se lembra em quem votou para deputado ou
senador, nem se sentiu representado.
Com processos eleitorais independentes, presidente e governadores também não têm
a fidelidade de seus legislativos. Só governam se cooptarem os partidos da base.
E esta cooptação obedece à Lei de Gerson criando-se um círculo vicioso. Isto
fica evidente quando constatamos que o custo das campanhas para serem bem
sucedidas ultrapassam em muito os ganhos salariais auferidos durante o mandato.
Os que não seguem esta prática dificilmente são eleitos. Representar o “povo”
virou um negócio de família, que no caso da Bahia chega a três gerações.
A atual campanha exemplifica claramente estes fatos. Os programas partidários
ficam apenas registrados no TER. Nas campanhas majoritárias apenas promessas
genéricas: melhorar a educação, a saúde e a segurança com mais investimento, mas
sem dizer como. Nas companhas legislativas nem isso, apenas uma foto colorida e
um número. Para os marqueteiros é preciso não se comprometer com nada, para não
ser contestado. Assim, a propaganda dos senadores e deputados é toda igual e
mais parece uma campanha da Kolynos. Cerca de 99% dos candidatos exibem
reluzentes dentaduras e um numeral, que não chegamos a gravar. Preferia o velho
e barato santinho, que guardávamos no bolso para a hora da votação.
Em Salvador esta campanha imagética chega a saturação nas avenidas de vale e na
Paralela. A indústria gráfica agradece a campanha multimilionária. Até quinze
fotos do mesmo candidato em fila rindo, ninguém sabe de que ou de quem. Em São
Paulo cartazes estão proibidas, no Rio, Brasília e demais capitais eles são
raros. Dirão que o tempo na televisão é mínimo e nos cartazes, devido à
velocidade dos veículos, ninguém lê. Marqueteiros mais criativos poderiam
associar o retrato do candidato com sua plataforma: um médico com um
estetoscópio, um defensor da Petrobrás com o capacete da companhia, um indignado
com uma vassoura. Apenas um boxer aparece com suas luvas e dois candidatos com
cachorrinhos.
Darcy Ribeiro dizia que não existia um cabrito abandonado neste pais, mas as
sinaleiras de nossas cidades estavam cheias de crianças abandonadas. Ninguém se
propõe ser o protetor das crianças ou do hospital da Irmã Dulce. Na Itália
quando fiz um doutorado a justiça eleitoral colocava painéis nos principais
pontos das cidade onde os candidatos colavam pequenos cartazes (A4) com sua foto
e suas plataformas eleitorais. A única propaganda inovadora desta campanha é um
retrato em branco e preto de um candidato inspirado nos versos de Chico: “Já
conheço os passos dessa estrada e...”
SSA: A Tarde de 28/09/14