Artigos de Jornal
Lelé: Arquitetura Social com alta tecnologia
Apesar de ter marcado Salvador com inovadoras passarelas e equipamentos
sociais, o Arq. João da Gama Filgueiras Lima, o Lélé, falecido em maio, foi
pouco reconhecido em vida e após a morte por nossas autoridades. Em parte isto
se deve a sua extrema discrição e aversão às promoções vazias das revistas de
decoração e do top of mind. Lelé estava em outro plano, o da dignificação dos
equipamentos sociais licitados pelo menor preço, porque destinados ao povão.
O carioca Lelé desenvolveria seu trabalho de alta tecnologia e relevância social
em silencio em Brasília e em Salvador. Na nova capital, levado pelos mestres
Nauro Esteves e Oscar Niemeyer, troca a musica e a boemia pela desolação do
cerrado. Descoberto por Darcy Ribeiro no canteiro da UNB é enviado à
Tchecoslováquia e à Polônia para observar a industrialização da construção
fazendo suas primeiras experiências no campus da UNB.
Selecionado professor da UNB em 1962, renuncia com mais 200 colegas e servidores
em 1965 em protesto pela transformação da universidade em caserna pelo golpe de
64, mas ganha de Niemeyer sua primeira oportunidade ao projetar o Hospital
Regional de Taguatinga. Essa experiência e o nascimento de uma filha com
problemas neurológicos orientaram seu trabalho para a questão da saúde e da
educação publica. Em parceria com o Dr. Aloysio Campos da Paz inicia na década
de 80 a rede hospitalar Sarah que se transformaria em uma referência mundial não
só de tratamento do aparelho locomotor como de arquitetura hospitalar.
Sem trabalho, aceita em 1973 o desafio do Secretario Mario Kertész, no governo
ACM, para concluir em tempo recorde o Centro Administrativo da Bahia. Deflagra
assim a pré-fabricação na Bahia ao lado de obras excepcionais em tecnologia
corrente como o portal do CAB e igreja da Ascensão. Constrói ainda a Estação da
Lapa, o Complexo de Delegacias e a igreja dos Alagados. No segundo mandato do
Prefeito Mario Kertesz, 1985-1989, cria a FAEC, onde aperfeiçoa a tecnologia da
argamassa armada ensaiada na comunidade de Abadiana, Goiás, aplicada a escolas,
abrigos, escadas-drenantes, lixódutos e passarelas cobertas, que seriam
reproduzidas em todo o país. Monta em 15 dias o Palácio Tomé de Souza na Pç.
Municipal e recupera com Lina Bardi casas no Pelourinho.
Com a redemocratização, Lelé é levado por Darcy Ribeiro para o Rio para fazer
com Niemeyer os CIEPS, no governo de Brizola, e escolas-parques do sistema CIACs
em todo o país, na administração de Collor de Mello. Cria em 1991, anexo ao
Sarah Salvador, o Centro Tecnológico da Rede Sarah, CTRS, que permitiria
pré-fabricar oito hospitais da rede Sarah e seis sedes estaduais do TCU com
inovador sistema construtivo e de ventilação natural com baixíssimo consumo
energético. Utiliza pioneiramente a mecatrônica para regular automaticamente
brise-soleils e claraboias de exaustão, como no Sarah do Rio. Em todas estas
obras painéis do artista Athos Bulcão.
Obrigado pelo TCU a fechar o CTRS, Lelé deixa projetos importantes como o
Tribunal Regional de Trabalho de Salvador, a Casa da Mulher e habitações
populares em encostas engasgados na burocracia estatal e no atraso das nossas
construtoras.
SSA: A Tarde de 12/10/14