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Sérgio Rodrigues e o modo Brasileiro de preguiçar
O ano de 2014 tem sido de grandes perdas para a arquitetura brasileira. Além
de Lelé e do professor Miguel Pereira perdemos em 1º de setembro, aos 87 anos, o
arquiteto e designer Sergio Rodrigues. Poucos leitores ouviram falar seu nome,
mas muitos não resistiram a experimentar sua envolvente “Poltrona Mole”, criada
em 1957 a pedido de um fotógrafo amigo, mas que ficou enfusada nas vitrines
durante meses por seu preço elevado.
Carioca formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1952, Sérgio é um
dos autores do Centro Cívico de Curitiba, porém se dedicou especialmente à
criação de moveis. Dois anos depois de formado foi contratado pela rede chique
de lojas Forma como designer de moveis, mas descobre logo que aquela não era a
sua praia. Em 1955 abre em Ipanema a loja/estúdio Oca, de arquitetura de
interiores e móveis, que logo se transformaria em point de intelectuais. O nome
de seu estúdio/fabrica já revela a sua preocupação com as nossas raízes.
Sua projeção internacional advém em 1961 quando ele ganha o 1º prémio no
Concurso Internacional do Móvel, em Cantú, Itália com a pouco conhecida
“Poltrona Mole”. Esta poltrona é uma robusta estrutura de madeira, em oposição
aos móveis de pés de palito da época, que suporta uma rede de couro sobre a qual
repousa um enorme almofadado que convida o passante a se esparramar
preguiçosamente e tirar uma soneca. Junto com Joaquim Tenreiro e Zanine Caldas
ele projeta o design brasileiro no mundo. A Poltrona Mole faz parte hoje do
acervo permanente do MoMa de Nova York.
Em seus treze anos de existência a Oca produziu cerca de mil diferentes modelos
de móveis de desenho avançado mas usando os materiais da tradição indígena e
luso-brasileira: madeira, couro e palha, ao invés do inox do Bauhaus ou a fibra
de vidro, contraplacados moldados e aramados dos americanos Saarinem, Eames e
Bertoia ou as espartanas cadeiras de Lina Bardi. Suas cadeiras e poltronas não
são rígidas e frias como as acima referidas, senão flexíveis e sensuais ao tacto
pois se inspiram nas redes, camas de varas, trançados e tamboretes de nossos
índios. São os descansos de Macunaíma.
Com problemas financeiros ele fecha a Oca em 1968 e abre um atelier onde concebe
moveis para monumentos como o Palazzo Doria Pamphili, embaixada do Brasil em
Roma, palácios da Alvorada e dos Arcos (Itamaraty) e Teatro Nacional de Brasília
além de grandes empresas nacionais e internacionais. Entre 1973 e sua morte ele
atua através da empresa Sergio Rodrigues Arquitetura realizando, além da de
móveis, casas pré-fabricadas com estrutura de madeira e cobertura de fibra de
vidro.
Seus móveis foram expostos em Buenos Aires, Madrid, Bruxelas, Roma, Estocolmo e
Nova York. Ele recebeu ainda o Prémio do Instituto de Arquitetos do Brasil pela
poltrona Killin em 1975, Prémio Lápiz de Plata Buenos Aires 1987, e Premio do
Museu da Casa Brasileira de São Paulo pela poltrona Diz, tão macia quanto a Mole
embora toda de madeira. Fica a lembrança desse guru bonachão no casarão de
Botafogo, de boina, rabo de cavalo e generoso bigode que filtrava sua fala grave
e mansa enquanto debaixo de sua calva juvenil Macunaíma não parava de traquinar.
SSA: A Tarde de 26/10/14