Artigos de Jornal
As primeira lições da crise
As crises são encruzilhadas de mudanças e inovação. A atual promete muitas,
pois é a um só tempo institucional, política, econômica e moral. Não dava para
suportar mais o mormaço em que vivíamos. Os próximos anos serão duros, mas
necessários. Muitas bolhas começam a estourar. A primeira é a explosão do falso
regime presidencialista. Já estamos vivendo um parlamentarismo informal, porque
não há uma vinculação orgânica entre legislativo e executivo, como nos EE.UU.
Para a provação de qualquer medida provisória ou lei é preciso pagar pedágio aos
parlamentares, com propina, liberação de verbas ou cargos. A reforma política
não pode ser apenas do código eleitoral.
A segunda lição é a falência do sistema representativo, não só no Congresso e
câmaras, como nos sindicatos e conselhos. Acordos firmados por sindicatos são
rejeitados pela categoria e a greve continua. Com a internet ficou fácil
mobilizar o povão, como temos visto em anos recentes no Brasil e no mundo.
Algumas manifestações derrubaram governos. Ou os governos compartem com a
sociedade as decisões ou as manifestações os desestabilizarão, como já vem
ocorrendo.
Terceira lição. A operação Lava Jato demonstrou que o maior rombo da Petrobrás,
R$ 54 bilhões, se deve ao superfaturamento dos contratos administrados pelo
cartel das empreiteiras. O mesmo se repete nas grandes obras, como metrôs,
ferrovias e rodovias. Não há projetos, concorrência nem fiscalização. É o
rebanho de lobos no galinheiro. Por outro lado, as grandes empresas não pagam
impostos e devem cerca de R$ 600 bilhões à União congelados (A Tarde, 12/05/15).
Sua execução depende do Conselho de Administração de Recursos Fiscais, CARF,
cuja vice-presidente é a advogada-chefe do Bradesco, maior devedor. Com a crise
econômica este dinheiro tem que voltar aos cofres públicos ou o pais quebra. É
urgente desprivatizar o estado para se restaurar o regime republicano.
Quarta lição, a lei de Gerson rege todas as ações do poder político e econômico,
como ficou demonstrado com a Lava Jato. Os grandes fraudadores, como diretores
da Petrobras e de grandes empreiteiras, branqueadores de dinheiro e políticos
dão uma de “pecadoras arrependidas” para obter a absolvição. Uma das leiloeiras
do Brasil, Noelma Kodama, em depoimento à CPI da Petrobrás deu aula de
macroeconomia e insinuou a solução para a crise: “O Brasil é movido a
corrupção... estamos (na fase) da corrupção da Petrobrás, dos empreiteiros e o
que aconteceu: o país entrou em crise, numa recessão. Quando parou a corrupção,
o Brasil parou”. Os parlamentares não contestaram. Risonha, terminou seu
depoimento debochado cantando “Amante, amada”. Prefiro terminar relembrando
Drummond do eterno “José”, que não tem sobrenome.
E agora, José?/ A festa acabou,/ a luz apagou,/ o povo sumiu,/ a noite esfriou,/
e agora, José?/ e agora, você?/ você que é sem nome,/ que zomba dos outros,/
você que faz versos,/ que ama, protesta,/ e agora, José?...Sozinho no escuro./
Qual bicho-do-mato, /sem teogonia, /sem parede nua/ para se encostar,/ sem
cavalo preto/ que fuja a galope,/ você marcha, José!/ José, pra onde?”
Precisamos de uma constituinte já, para refundar a nação.
SSA: A Tarde, 24/05/15