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Navegar é Preciso

  • 28 de Fevereiro de 1993

Quatrocentos anos antes de se falar em região metropolitana, Salvador já comandava uma rede de cidades ligadas a ela por hidrovias. A rede era integrada pelos portos de Salvador, Itaparica, Santo Amaro, São Francisco do Conde, São Roque, Maragogipe, Cachoeira, Jaquaripe e Nazaré. A Cia de Navegação Baiana substituiu a vela pelo vapor e manteve as rotas. A hegemonia do automóvel fez a estatal adotar em 1970 o ferry boat com apenas dois destinos, Itaparica e Maragogipe. Com uma privatização malfeita esse sistema foi reduzido a apenas um destino, Itaparica.
Na Baia da Guanabara barcas ligam o Rio de Janeiro a Niterói, Charita, Paquetá, Cocotá, Ilha Grande e Mangaratiba. A concessionaria perde em algumas linhas e ganha em outas transportando 110 mil pessoas dia. Catamarãs novos com capacidade de até 2.000 passageiros saindo a cada dez minutos fazem os 13 km que separam o Rio de Niterói em 20 minutos. Em Belém a rede é ainda maior. No Maranhão, na Baia de São Marcos, duas companhias de ferry boats ligam São Luís a Cujupe em Alcântara e uma delas tem ônibus para levar os passageiros aos destinos finais. Isto é concorrência.
Nessas cidades como em Paranaguá, Santos e Porto Alegre os barcos e balsas são das concessionárias. Na Bahia é diferente, os ferry boats são do estado. Caberia as concessionárias, que se sucederam nesses 30 anos, fazer a manutenção dos equipamentos, mas elas canibalizaram a frota para não gastarem com a manutenção. Quantos ferry boats enferrujam em Aratu ou foram vendidos como sucata? O mal funcionamento do sistema ferry boat decorre do modelo de concessão e gestão adotado pelo estado.
Quando a empresa americana/canadense Cia. Linha Circular se interessou pela distribuição de energia e carris de Salvador, em 1928, os gestores públicos da época exigiram a ampliação da rede, bondes novos e a construção do novo Elevador Lacerda, que seriam incorporados à prefeitura depois de 30 anos. Não foi generosidade dos gringos, business is business. Um dos princípios do capitalismo é: “quem não tem capital não se estabelece”. Só no Brasil esta regra não é cumprida.
Parceria Público Privado (PPP) no Brasil é o poder público fazer o investimento e o privado ficar com o lucro. Foi assim na Arena Fonte Nova, com o repasse da doação do BNDES para mobilidade na Copa, e algo semelhante está sendo feito no metrô e na Linha Viva. O município ainda entra com isenção de impostos. É a chamada bolsa empresário, que é muito maior que a bolsa família. O BNDES, banco que se diz social, está financiado obras bilionárias em toda a América Latina e África para favorecer o Clube das Empreiteiras, ao invés de financiar a renovação e ampliação da nossa infraestrutura atrasadíssima por não termos políticas públicas.
Se tivéssemos planejamento viário poderíamos ter um sistema hidroviário metropolitano com catamarãs rápidos levando e trazendo operários, técnicos, turistas e cargas para o CIA e porto de Aratu, São Francisco do Conde e Relan, Madre de Deus e Temadre, Santo Amaro, São Roque e estaleiros do Paraguaçu, Maragogipe, Saubara, Nazaré e Valença. Sistema que seria integrado ao transporte ferroviário e rodoviário. Viver também é preciso.
SSA: A Tarde, de 28/02/93


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