Artigos de Jornal
Pensar grande e sério a Bahia
Em meados do ano passado um velho sonho de integração sul americana voltou à
baila com o interesse dos chineses de construírem uma ferrovia ligando o
Atlântico ao Pacifico para baratear nossas commodities. Para isto mandaram uma
missão ao Brasil. Naquele momento, o Rio de Janeiro lutava para que a partida da
ferrovia fosse no porto de Açu, situado a 23º de latitude Sul, enquanto os
paulistas lutavam pelo porto de Santos, situado a 24º S. Lobbies peruanos e
brasileiro defendiam que o porto de chegada fosse Bayovar (6º S.), no extremo
norte do Peru. Em território brasileiro a ferrovia passaria por Rondônia e Acre
antes de se adentrar no Peru.
Apesar da proposta mais bem elaborada dessa ferrovia ser do engenheiro baiano
Vasco Azevedo Neto, as nossas autoridades não se mexeram. Para despertá-las
escrevi neste jornal o artigo A Bahia e a ferrovia transcontinental, (5/7/2015).
Sugeria que o governador falasse com Jaques Wagner, Chefe da Casa Civil, para a
Bahia entrar nessa disputa. Como sempre, nenhuma reação. Defendia o projeto de
Vasco Neto por ser o mais racional. Não faz nenhum sentido sair da latitude de
23ºS para chegar a 6ºS cortando a floresta amazônica e tornando-a pouco
competitiva no confronto com a nova eclusa do Panamá. Além do mais, esta seria
uma ferrovia binacional, que não promoveria a integração sul-americana. Esta
decisão não pode ser apenas das empreiteiras, senão do Itamarati. O projeto
Bioceânico Aconcágua, argentino–chileno, fracassou por ser um projeto
binacional.
Vasco Neto imaginava a via férrea saindo de Campinho, em Marau (13º 30’ S), e
chegar próximo à divisa do Chile com o Peru, provavelmente em Arica, na latitude
18º S. Este é o menor percurso e o único capaz de integrar as redes ferroviárias
do Brasil, Bolívia, Chile e Peru, dando inclusive um porto-livre à Bolívia. Como
deputado federal, Vasco conseguiu que se iniciasse a construção do porto de
Campinho, na década de 1970. Mas os defensores do rodoviarismo e o aumento do
calado dos navios inviabilizaram Campinho. Movida pela intenção de integrar
logisticamente o pais, o Governo Federal projetou a Ferrovia de Integração
Oeste-Leste, FIOL, terminando no Porto Sul, em Ilhéus. Esta ferrovia construída
pela nebulosa Valec se arrasta há anos. Para a Bahia ela possibilitaria a
exportação da soja do oeste baiano e do minério de ferro de Caitité. Com a
desvalorização do preço do minério de ferro, a FIOL e o Porto Sul estão
perigando.
Em recente viagem do Governador Ruy Costa à China, para surpresa da comitiva, os
chineses demonstraram imediato interesse pelo porto e pela ferrovia, ao tempo
que descartaram o sonho da ponte turística de Itaparica. A razão é simples,
entre o porto congestionado de Santos e o paralisado de Açu, no Rio, é
preferível ter um porto que possa chamar de seu e boa parte da ferrovia
transcontinental. Além do mais, o Porto Sul está numa altura muito próxima do
porto no Pacífico.
A notícia não passou de duas linhas nos jornais. Aparentemente os nossos
governantes e empresários, se é que ainda existem, pensam apenas em resolver o
problema da Bamim. Não fazem ideia do que pode representar um porto
internacional e a ferrovia transcontinental partindo da Bahia. Significa
ganharmos com as exportações do Peru, Chile, Bolívia e de todo o Oeste do
Brasil. Poderemos, ainda, exportar grãos e minérios pelo Pacifico.
Se concretizada a parceria, temos a possibilidade de articulação da ferrovia
transcontinental com o hub-port, que venho defendendo, no canal de Itaparica,
que tem 21m de profundidade. Além da articulação com o Pacífico, isto nos daria
a hegemonia portuária da costa brasileira. É preciso pensar grande e sério a
Bahia e não apenas o carnaval perene, sintetizado no slogan: sorria, V. está na
Bahia!
SSA: A Tarde, 10/04/16