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Rumo ao ano 2000

  • 29 de Março de 1994

Muito pouca coisa mudará na nossa cidade nos próximo seis anos. Contudo, algumas novas perspectivas se abrem para o novo milênio, depois da superação da crise que assolou a cidade nos último trinta anos e que continuará assolando se não lutarmos por mudanças.
A primeira delas é a desaceleração do crescimento demográfico, tanto pela diminuição da taxa de urbanização, quanto da de crescimento vegetativo. Isto cria a possibilidade de uma diminuição relativa das demandas acumuladas de serviços públicos, especialmente as referentes à habitação, ao saneamento básico e ao transporte público. A concretização desta perspectiva dependerá de uma vontade autenticamente política e da existência de recursos para tal.
Isto nos leva a uma consideração sobre a vocação econômica da cidade. Depois da tentativa de industrialização das décadas de 60 e 70, com o CIA e o Copec, que aparentemente chegou a um ponto morto, Salvador, com seu grande acervo cultural, Baía de Todos os Santos e posição geográfica privilegiada, ponto de partida de extensos roteiros de praias, oferece grandes perspectivas de crescimento turístico, seguindo a vocação natural da região Nordeste.
A consolidação e expansão dessa atividade trarão, inevitavelmente, a valorização do seu Centro Histórico e da Bahia de Todos os Santos, tendências que já se faz sentir com os grandes investimentos do estado no Pelourinho e interesse do setor privado por novas marinas e transporte hidroviário. O turismo, se devidamente orientado, poderá incrementar muitos outros serviços, ainda que remotamente relacionados com a atividade, oferecendo mais empregos que a indústria.
A valorização destas duas áreas por agentes exógenos, contrariando o interesse da classe média local pela orla atlântica, que a rigor nunca chegou a se consolidar como área de habitação e serviços, tende a estancar a marginalização do antigo centro de Salvador e infletir esta tendência na direção do restauro de sua centralidade política, simbólica, cultural e funcional.
Criam-se, assim, dois grandes desafios, para as futuras administrações municipais. A restauração e modernização do centro tradicional (e não apenas do Pelourinho) e a infraestruturação de sua imensa periferia pobre. A superação deste duplo desafio exigirá que a Prefeitura restaure sua capacidade de investimento mediante uma crescente participação nos mecanismos de geração da renda urbana.
É um equívoco pensar que Salvador seja uma cidade indigente, sem meios para controlar seu próprio desenvolvimento. Esta cidade é o segundo mercado imobiliário do país. Indigente é sua Prefeitura. Mudar esta situação é vantajoso para toda a população, inclusive para operadores imobiliários, que terão novas oportunidades. A sociedade tem que entender isto.
Mas não basta uma reforma fiscal, é necessário dotar a cidade de um plano inteligente, de eficientes instrumentos de controle do uso do solo, que contemple as especificidades de sua história, geografia e cultura. Desde a descaracterização do plano EPUCS, há cerca de 30 anos, e crescente burocratização da administração municipal, não se faz outra coisa senão intervenções desarticuladas na cidade, com enorme desperdício de recursos e agravamento de seus problemas.
Pensar a cidade do próximo milênio e lutar por novas conquistas é exercer o mais alto de nossos direitos, a cidadania. Salvador poderá voltar a ser a mais bela, civilizada e segura capital brasileira, se nós quisermos.

SSA: Bahia hoje, 29/03/1994


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