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“O país do Carnaval”

  • 24 de Março de 2019

Tivemos um carnaval excepcional. Os blocos tomaram conta das ruas da maioria das capitais. No Rio e em São Paulo, eles não só lotaram as vias, como batucaram 15 dias. Apesar de críticas contundentes, os conflitos foram mínimos considerando as multidões envolvidas. A Mangueira, vencedora carioca, reescreveu crítica e ironicamente a nossa história cantando e dançando. Esta é uma das características nossa, em contraste com os protestos violentos na França e em outros países, no mesmo período.

As canções, as charges e a ironia são trincheiras de resistência democrática. Vencemos a ditadura de 64 embalados pelas canções de Vandré, Chico Buarque e outros. O Barão de Itararé (1895-1971), crítico de Vargas, depois de ser espancado pelos agentes do DOPS colocou na sua porta “Entre sem bater”, que ganhou a mídia, mesmo censurada. Dele são frases como: “o voto deve ser rigorosamente secreto, só assim o eleitor não terá vergonha de votar em seu candidato”; “a criança diz o que faz, o velho o que fez e o idiota o que vai fazer”; “nunca desista de seu sonho, se acabou em uma padaria, procure em outra”; “este mundo é redondo, mas está ficando muito chato” (terraplanistas).

Millor Fernandes (1923-2012) foi autor de máximas sempre atuais: “o Brasil é, sempre foi, uma empresa unifamiliar”; “se durar muito tempo, a popularidade acaba tornando a pessoa impopular”; “nos últimos e dramáticos acontecimentos, perdi uma magnifica oportunidade de ficar calado”; “se seus princípios são rígidos e inabaláveis, você, pessoalmente, já não precisa ser tanto”; “o Brasil é os Estados Unidos, onde eu vivo”; “as pessoas que falam muito, mentem sempre, porque acabam esgotando seu estoque de verdades”; “quem sabe tudo, é porque anda muito mal informado”; “antigamente os animais falavam, hoje escrevem”; “jornalismo é oposição, o resto é armazém de secos-e-molhados”.

Para Jorge Amado o Brasil era o país do carnaval. Millor dizia: “viva o Brasil/ onde o ano inteiro/ é primeiro de abril”. São dele as frases: ”errar é humano, botar a culpa nos outros também”; “jamais diga uma mentira que não possa provar”; “quando disserem que o crime não compensa, você tem de lembrar que isso é porque, quando compensa, não é crime”; “o dinheiro não só não fala como faz muita gente calar a boca”; “isto é que é Congresso eficiente, ele mesmo rouba, ele mesmo investiga e ele mesmo absolve”. Millor foi um intelectual que se expressava pela ironia e humor: “o Brasil (foi) condenado à esperança”.

Patéticas são as declarações de alguns políticos. Sergio Porto, que se assinava Stanislaw Ponte Preta, publicou entre 1966 e 1968 três livros que foram um estouro editorial, chamava-se Febeapa, Festival de Basteiras que Assola o País. Sebastião Nery foi além, publicou entre 1973 e 2002, cinco volumes de Folclore Político. Tem muita gente coletando perolas do tipo nos tweeters para enriquecer o anedotário político brasileiro.

SSA: A Tarde, 24/03/2019


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