Artigos de Jornal
Respondendo a meus leitores
Meu artigo de 05/04/20 em A Tarde sobre a desindustrialização do país
provocou um amplo debate no Facebook. Recebi apoios e algumas contestações. Só
posso responder às últimas.
Ecles Lisboa levanta algumas questões. Zerar impostos, inclusive de produtos que
não fabricamos desestimula sua produção interna e investimentos externos. Guedes
não representa o setor produtivo, que cria empregos, senão financeiro, que ganha
o mesmo importando ou exportando. Ele sabe dos impactos dos acordos de comércio
e por isso quer gradual. Abrir mais o que? Importamos desde meias a carros de
luxo. Todos os organismos internacionais constatam que o livre-comércio aumentou
a distancia entre ricos e pobres e deflagrou migrações massivas do Oriente Médio
para a Europa, da América Central para os EUA.
China, Correia do Norte e Cingapura, que haviam feito investimentos enormes em
educação, alta tecnologia e infraestrutura, pularam na frente dos EUA que
defendiam o livre-comércio. A briga hoje é da alta tecnologia: EUA X China,
Reino Unido X União Europeia, Rússia X Arábia Saudita. O desafio não vem mais do
Norte, mas do Leste. Os EUA adotam sobretaxas e cotas e nós continuamos a pensar
como o Chile de 1970, que implodiu. A desindustrialização do país começou em
1990, mas o corte da pesquisa por Guedes, a venda da Embraer e a entrega da base
de Alcântara sem transferência de tecnologia acentuam mais a nossa dependência e
descompasso mundial. O abandono da política externa multilateral, do Acordo de
Paris, o desmatamento da Amazônia e os ataques à China, nosso maior comprador,
só aumentam o nosso isolamento. Algumas reformas são necessárias, mas não
incrementarão a nossa competitividade, não criarão empregos, nem desativarão a
bomba social.
Dirceu Romani observa que em todo mundo só se vê produtos da China, Vietnã, Sri
Lanka e Bangladesh. É verdade, os ricos não querem mais produzir, só especular
nas bolsas. A pandemia está mostrando o desastre dessa dependência nos EUA,
Europa e Brasil.
Meu amigo Lito Passos afirma: “A indústria nacional acaba devido ao excesso de
proteção e a falta de produtividade do trabalhador brasileiro” e faz uma
caricatura dos nossos operários. Simples assim? A nossa indústria está acabando
porque não tem apoio oficial, tecnologia competitiva e infraestrutura, portos,
ferrovias, cabotagem, e a concorrência não regulamentada dos orientais. Conheço
bem o setor da construção, a maior indústria do país, e as péssimas condições de
trabalho, segurança, treinamento e remuneração dos trabalhadores. O que ele
fazem é um milagre. O absenteísmo é alto pela falta de saneamento e o desmonte
do SUS: dengue, zika e chicongunha.
Adorei a síntese do artista e meu ex-aluno Jamison Pedra Prazeres: “Voltamos aos
tempos de exportar látex e importar chiclete, exportar cacau e comprar
chocolate”.
SSA: A Tarde, 19/04/2020