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Dar a volta por cima...

  • 26 de Fevereiro de 2012

A situação de abandono e desgoverno a que chegou Salvador tem provocado algumas reflexões mais profundas neste jornal sobre a decadência da cidade. Dentre estas, destaco o artigo de Fredie Didier “Salvador não passa por um bom momento histórico”, no qual o autor identifica uma crise existencial de Salvador e nos convida a refundá-la. Os gravíssimos acontecimentos recentes em Salvador, quando policiais armados pararam a cidade, tomaram a Assembléia, e foram verificados 187 homicídios na RMS, com pelo menos 45 deles com características de execuções, sugerem que a crise não é só de Salvador, mas da Bahia.

Durante doze dias fomos linchados pelos jornais de todo o Brasil e os fatos noticiados em todo o mundo, com exageros nos EUA. Dentre os artigos mais duros publicados no sul, provocando irritação nos baianos, estão o de Gilberto Dimenstein “A Bahia é uma mentira” e o de Caetano Veloso “Mentira”. Não cabe aqui discutir de quem é a culpa desta situação. Seguramente de todos nós. Precisamos, sim, entender o que ocorreu e dar a volta por cima.

O declínio da Bahia começou com o golpe militar de 1964 esmagando o movimento cultural iniciado em 1946 por Anísio Teixeira e Edgar Santos, que nos colocou na vanguarda da educação e das artes no país. Por outro lado, a repressão estudantil impediu a formação de novos líderes políticos. Continuamos com os descendentes e afilhados de ex-governadores das décadas de 50 e 60. A exceção é a emergência de lideranças sindicais do PT. Mas com a morte do socialismo-real, acabaram-se as ideologias políticas e quase tudo virou fisiologismo.

Assistimos inertes à venda de nossos bancos. Ficamos reduzidos a apenas três grupos econômicos, dois originários da construção civil, que monopolizam as obras do estado, há anos, e um do interior, de varejo. Perdemos o cacau por falta de fiscalização fitossanitária e as novas culturas, como a soja, saem por outros estados, situação que o atual governo tenta reverter.

Em 1968, o francês Michael Parent, em missão da UNESCO, disse que Salvador era uma cidade de arte como Toledo. Criou-se o IPAC e tentou-se restaurar o Pelourinho. Mas na mesma época, as terras e serviços públicos municipais foram privatizados. Hoje Salvador é uma cidade dominada pelos cartéis imobiliários, dos transportes e do lixo. O resultado é uma cidade congestionada, travada, suja, violenta e com seu centro histórico esvaziado.

Perdemos, por outro lado, duas editoras, Progresso e Civilização, e importamos livros didáticos de escritores e educadores de outros estados. Nossas faculdades privadas foram vendidas para grupos estrangeiros. No campo da cultura popular e do lazer tudo virou axé e carnaval de aluguel, dentro de currais móveis e camarotes de luxo. As festas de largo foram sepultadas para dar lugar aos carros

Não soubemos aproveitar oportunidades, como a das mídias eletrônicas. Não possuímos um núcleo de software, como Recife, nem gravadoras para os nossos compositores, mas temos uma indústria de CDs e DVDs piratas. Fundamos e perdemos algumas das maiores empresas de publicidade do país. Alguns dirão que é o avanço do capital monopolista e da globalização e que não ha nada a fazer. Milton Santos e outros autores defenderam e fatos recentes confirmam que há outra globalização, que pode libertar e não apenas oprimir.

Como reverter esta situação? Não é com campanhas de marketing ou esperando um messias. Toda a sociedade deve se mobilizar politicamente para reconstruir a Bahia e restaurar a nossa auto-estima. Não somos um bando de preguiçosos, gigolôs e vadias como se estereotipou a baianidade.

Sempre nos destacamos na literatura, na musica, nas artes e na publicidade e esta criatividade é a mola do setor terciário superior, o da geração e compartilhamento da informação e da pesquisa tecnológica. É nisso que os países mais desenvolvidos estão investindo. As universidades têm um papel fundamental nessa revolução e precisamos transformá-las em alavancas de desenvolvimento sócio-econômico e não apenas formadoras de mão de obra para o mercado. Saber é poder.

SSA: A Tarde de 26/02/2012


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